Níveis de Protensão - o que são e como utilizar?

Eng. Thiago Jucá

Não podemos negar que o dimensionamento de estruturas protendidas envolve uma complexidade extra no projeto, que geralmente envolve o uso de softwares sofisticados como TQS ou ADAPT para consideração dos efeitos oriundos da protensão. No entanto, tal custo extra se justifica pelas diversas vantagens que o sistema estrutural em Concreto Protendido traz consigo.


Em geral, para maior aproveitamento da técnica de protensão, utilizamos os Níveis 2 e 3 definidos pela NBR 6118:2014 (respectivamente, Protensão Limitada e Completa). Em ambos os casos, destacamos a ideia de que a estrutura não fissura em serviço, o que garante benefícios estruturais, como maior durabilidade e consideração da seção integral da peça (para cálculo das flechas, por exemplo).


No entanto, a norma define também a chamada Protensão Parcial (Nível 1), que apresenta critérios bem menos rigorosos aos níveis anteriores. Saber escolher o nível de protensão adequado para cada situação de projeto é uma qualidade indispensável para um bom projetista de estruturas protendidas. Continue lendo para compreender quais são essas situações!

conceitos de norma

Comecemos entendendo o conceito de Nível de Protensão (muitas vezes, confundido com os Tipos de Protensão). Em termos práticos, é a intensidade de força de protensão aplicada em relação a um determinado elemento estrutural.


No entanto, citando meu antigo professor Eng. Dr. Enson Portela, vocábulos como “grande” ou “pequeno” não significam muito em engenharia. Utilizar 4 cabos em uma viga protendida de 19x40 é algo totalmente diferente de utilizar os mesmos 4 cabos em uma viga-faixa protendida de 160x31, ou ainda em uma laje inteira de 20cm. A intensidade da protensão depende não apenas da quantidade absoluta de cordoalhas adotada, mas também do contexto no qual ela se insere: tipo do elemento, dimensões, carga atuante resistência do concreto, etc.


Destarte, precisamos de critérios formais bem definidos para estabelecer o que seria uma protensão de intensidade baixa (parcial) ou média/alta (limitada/completa). E é exatamente isso que a norma NBR 6118:2014 nos fornece em sua Tabela 13.4, reproduzida abaixo:

critérios da nbr 6118:2014

Da tabela, vemos que os critérios adotados para quantificar a protensão levam em consideração determinados estados-limite em determinadas combinações de carga. Isso é bastante razoável, já que contempla a maior parte das incógnitas que podem variar de um contexto estrutural para outro.

Pela norma, podemos dizer que temos uma Protensão Completa quando 
atendemos ao Estado-Limite de Descompressão (ELS-D) na Combinação Frequente e, simultaneamente, ao Estado-Limite de Formação de Fissuras (ELS-F) na Combinação Rara. De acordo com o prof. José Milton Araújo, Combinações Frequentes ocorrem na ordem de 5% do tempo de uso de uma edificação, enquanto Combinações Raras ocorrem na ordem de uma vez a cada cinquenta anos. Isso significa que, em média a cada cinquenta anos, existe a possibilidade de se formar uma fissura. É fácil perceber que isso corresponde a uma alta intensidade de protensão aplicada na peça.


A Protensão Limitada, por outro lado, é menos conservadora. Para atendê-la, a norma exige apenas que o projetista atenda ao ELS-F apenas na Combinação Frequente, e, ao mesmo tempo, ao Estado-Limite de Descompressão na Combinação Quase-Permanente (CQPERM). Já comentamos a ordem de grandeza na qual Combinações Frequentes ocorrem, mas as Quase-Permanentes ocorrem cerca de 50% do tempo de uso da edificação.


Na prática de projetos, geralmente o gargalo se encontra em garantir o ELS-D na CQPERM, o que muitas vezes conduz a níveis de protensão intensos da mesma forma para atender esse critério. Existe um longo debate se isso é mesmo necessário, já que, de toda forma, garantimos que as tensões de tração não sejam capazes de formar fissuras cerca de 95% do tempo de uso. Não entraremos aqui nesse debate, mas apenas introduzimos o questionamento por ele ser o motivo da observação 3, que consta no inferior da Tabela 13.4, o qual dispensa a verificação do ELS-D na CQPERM para lajes protendidas lisas e cogumelo. Portanto, a observância desse critério, por norma, seria apenas para o caso de vigas.


Finalmente, temos a Protensão Parcial, que não exige qualquer critério de tensão, porém exige um determinado controle da abertura de fissuras. Se controlamos a abertura de fissuras, significa que, nesse nível, admitimos tensões de tração superiores a 

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Ou seja, o concreto fissura em serviço, tal qual o concreto armado, mas ainda podemos considerar como uma peça protendida se atendermos ao controle de fissuras explicitado em norma. Caso contrário, temos concreto armado. Vemos, pois, que a intensidade de
protensão em relação à peça é bem inferior ao que descrevemos nos outros níveis.

quando utilizar cada um?

Conhecidas as principais diferenças entre os níveis de protensão definidos em normal, talvez o leitor agora se pergunte quais os casos de uso de cada uma dessas intensidades definidas. Nos focaremos agora em explicar de forma simples qual deles você, projetista, deve adotar em cada situação de projeto.

O uso da Protensão Parcial é o que alguns chamam de “Concreto Armado com Protensão”. Isso porque todo o dimensionamento é feito de forma idêntica ao CA, fazendo o dimensionamento no Estado-Limite Último e verificando o Estado-Limite de Serviço. Porém, utilizamos a protensão para diminuir eventuais deformações excessivas em pontos específicos da estrutura. É a forma mais arcaica de se utilizar protensão, mas não quer dizer que seja menos efetiva. De fato, se a estrutura está bem resolvida em Concreto Armado, mas necessita apenas de um alívio nas flechas, seja em um vão grande ou em um balanço específico, é o caso de uso perfeito. É necessário apenas entender que não se tirará proveito da maior parte dos benefícios de uma estrutura protendida - inclusive, as flechas devendo ser calculadas com a inércia reduzida da seção.Por outro lado, no Brasil, o uso de Protensão Completa muitas vezes é evitado, já que a norma exige o uso de armadura passiva mínima de qualquer forma. Ou seja, mesmo com uma intensidade de protensão tão alta, ainda teríamos de adotar uma armadura passiva mínima, que nunca é solicitada, mas mesmo assim precisa constar, de forma que não obtemos o melhor aproveitamento possível dos materiais.
Na foto: provável uso de protensão limitada ou completa
Como qualquer outra solução, a Protensão Limitada não é bala de prata, pois pode acabar sendo uma solução mais cara do que determinado lançamento em Concreto Armado que também atende ao problema. Às vezes, tudo que seu projeto precisa é de algumas cordoalhas pontuais para reduzir a flecha de um vão grande demais para CA. E cabe a você, projetista, decidir qual a solução mais adequada. No lugar de adotar sempre Limitada ou sempre Parcial, é importante entender as diferenças entre os níveis e o caso de uso de cada um deles, e não ser apenas mais um que repete a mesma solução em todo problema, seja ela vantajosa ou não. Afinal, para quem só saber usar martelo, todo problema é prego.
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